quinta-feira, setembro 27, 2007

Zé Celso é anacrônico?

Há uns anos atrás eu assistia a uma discussão na minha sala de Estética da Comunicação: Zé Celso Martinez faz há trinta anos a mesma coisa. Era o que dizia uma colega. Eu, aspirante à atriz, mas pouco conhecedora do Teatro Oficina, só fazia observar e nada intervir o responder. Que podia eu dizer? Do Oficina só sabia das suas histórias de resistência à ditadura e de muita gente nua. Oito anos se passaram, mas a discussão continua. Zé Celso é anacrônico, afirmam muitos.

Na primeira semana de setembro (desculpem, ando escrevendo muito atrasadamente), o Teatro Oficina Uzina Uzona teve uma passagem por Salvador apresentando a saga de Os Sertões, a peça inteira, dividida em cinco noites, totalizando 32 horas de espetáculo. Não sei eu se isso é anacronismo, mas sei que em Salvador, mais de 1h30 de peça já é motivo de muxoxo e chiadeira na platéia. Fui tentando responder a essa pergunta, mas confesso que não me é possível. Me falta bagagem, me falta conhecer mais daquele teatro.

Mas me sobrou uma impressão contrária. Não de anacronismo. Se falamos de tempo é preciso reconhecer que é o tempo hoje relativo. E se ele é relativo, o tempo muda de ponto de vista para ponto de vista. Logo, para a estética teatral vigente em Salvador, para a nossa forma de fazer teatro hoje, posso afirmar que aquilo que Zé Celso constrói no palco está longe de ser anacrônico. Talvez ele o seja em sua terra natal, talvez o seja na Alemanha. Mas para os nervos dos baianos, tudo aquilo soa novo, soa uma experiência ainda não vivida.

E eu, aspirante a atriz e jornalista de férias, me vi diante de uma vivência muitas vezes atávica. Quero dizer, que em tantos momentos, me sentia fora desse tempo. Desse tempo de hoje, das mensagens tão rápidas, tão diretas, da necessidade de dizer tudo de uma forma meio mais simples, meio sem consumir muito o tempo do outro, que tem pressa. Atávica por tantos momentos me via dentro de cirandas, de rituais, de transes, mas também de raciocínios. Nada me surpreendia de fato. E não sei se essa falta de surpresas é para alguns anacronismo. Para mim, a novidade era me sentir numa experiência que podia tanto ser próxima daquela que aprendi nos livros como era o modo de assistir ao teatro grego. Uma proximidade, um aroma daquele outro tempo. Também não sei se é isso anacronismo.

Sim, há excessos, a verborragia, há baco em excesso pra Canudos. Há um Antônio Conselheiro liberal demais, há uma enxurrada de auto-referencialidade, há um punhado que cansam, que escapam. Mas há uma disponibilidade de fazer um teatro tão verdadeiro, tão entregue. Tão nu. Tão fiel aos seus propósitos. E dane-se o público. E que venha o público e vá ao centro do palco, como estrela principal. E faça parte. E dance.

5 comentários:

franklin albuquerque disse...

Mônica,

Acompanho o trabalho do Zé Celso no Teatro Oficina desde o inicio da década de 90 com a estreia de "Hamlet" espetáculo que marcou a reabertura deste teatro. De toda a produção até hoje o único espetáculo que não vi foi "Misterios Gozosos", participei inclusive do espetáculo "Bacantes" que foi apresentado ai na Bahia com quase sete horas de duração ! e foi um tremendo sucesso ! com mais ou menos umas 1.300 pessoas por noite ! vivenciei também por hum ano o processo dos "sertões" que infelizmente não pude ficar. Te digo : Zé Celso não é ,nunca foi, nem nunca será anacrônico ! nem ai em Salvador ,nem aqui em São Paulo e nem em lugar nenhum do mundo !inclusive tenho a quase certeza que o que o Zé faz está muito além destes parâmetros de julgamentos que querem classificar o que não é classificável ! é como voce falou, é uma vivência que não se enquadra mais neste nosso tempo de corre corre e massificação !Inclusive um outro grande nome do teatro brasileiro o diretor Antunes Filho foi ver o espetáculo "Os Sertões" e afirmou que saiu do teatro renovado !logo ele que há alguns anos atrás também afirmou na revista "Bravo" que o teatro Oficina era crepúscular, enfim...
Acho que algumas coisas realmente se repetem no teatro do Zé, mas e dai ? quem neste pais faria o que ele fez ? transformar um livro grandioso em imagens, emoções sensações etc...ficar anos debruçado em buscas de soluções cênicas que retratassem fielmente ou quase ou com licenças poeticas que acredito que Euclides teria aprovado sem restrições ? enfim...e só estamos falando dos "Sertões" ! Quem te escreve é alguem que teve a vida transformada depois de passar pelo teatro Oficina e pelas mãos do Zé...Sai dai de Salvador em 1991 depois de ter passado pelas mãos de Hebe Alves, esta também uma grande transformadora e mestra em minha vida !moro em São Paulo a exatamente 16 anos, passei temporadas ai em Salvador trabalhando com Márcio Meirelles e todo o pessoal do vila, Gordo Neto Jarbas Bittencourt, Chica enfim... sou apaixonado por teatro !tenho visto absolutamente de tudo aqui em São Paulo e te afirmo: o que voce viu foi vida !
quem perdeu, perdeu !!!!!!!!!!!!!

beijão,

Franklin Albuquerque

Anônimo disse...

Querida, isto � tes�o. Elementar.
Tinha algum gatinho na equipe? Dentre os atores nus?

Anônimo disse...

Maravilha Mônica, é isso mesmo!

Fernando Monteiro

Anônimo disse...

Z� Celso � o mais jovem e contemor�neo, n�o diria diretor de teatro mais artista brasileiro. ele faz arte, n�o � decorador, nem funcion�rio de palco, como existem muitos aqui na Bahia. z� FAZ UM teatro descolonizado, que quebra tabus, conceitos e pre-conceitos. Est� al�m do bem e do mal. Infelizmente muitos dos "formadores de teatro" em Salvador s�o med�ocres e covardes n�o tem a coragem nem a vitalidade e capacidade de fazer um teatro ritual total como o que Z� faz, � sempre um presente pra Salvador t�-lo aqui, ainda que t�o raramente. Avante artistas/criadores saiam do arm�rio e criem!

Anônimo disse...

Ai, Mônica que inveja! Desejava tanto ver 'Os Sertões'... Ai, lugar que nada chega!
Saudades do pouco daí que agora me parece tanto.
E que bom descobrir 'A casa da atriz'
Saudade
Bj